Em comemoração aos 27 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), os defensores públicos do Núcleo da Criança e do Adolescente da Defensoria Pública do Estado de Sergipe, Karine Neri, Paulo Cirino e Fillype Rigaud realizaram um mutirão de atendimento na Unidade Socioeducativa de Internação Provisória (USIP), para analisar todos os processos de adolescentes que estão internado há mais de 45 dias.
“O Núcleo da Criança e do Adolescente acompanha, diariamente, os prazos de internação provisória, e, infelizmente, tem se tornado regra a prorrogação deste prazo. Verificamos que há adolescentes internados provisoriamente há mais tempo do que permitido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que é de 45 dias. Existem adolescentes que estão no local há mais de 120 dias, em total desrespeito à Lei e ao entendimento já pacificado pelos Tribunais Superiores", disse Karine Neri.
Os adolescentes M.G.O, J.F.L e V.F.S. foram apreendidos pela primeira vez e estão internados no local há mais de dois meses por roubarem cinco carneiros no município de Canindé do São Francisco. “Roubamos os carneiros para comer e não para vender porque minha família estava passando fome, além da mãe de meu colega V.F.S que também passa por necessidades financeiras. Não entendo porque estamos aqui na USIP por ter roubado carneiro para matar a fome. Tenho filho e mulher, por isso, estou arrependido, mas infelizmente na hora do desespero a gente comete erros”, relata MGO.
De acordo com a defensora pública, todos os processos com prazos excedidos estão sendo analisados a fim de se impetrar o Habeas Corpus. “A Defensoria Pública acompanha todos os processos em que as partes não constituíram advogado particular, e, em todos os casos, quando expiram os 45 dias, entramos com o Habeas Corpus, requerendo, liminarmente, a desinternação do adolescente. É inadmissível ver que a lei está sendo atropelada, afinal, o ECA prevê que o prazo de internação provisória é de 45 dias, sendo este prazo improrrogável, mas, infelizmente, não é o que presenciamos na unidade de internação provisória do Estado de Sergipe”, lamenta Karine Neri.
O adolescente M.W.N.F., que completou 18 anos no último dia 12, e que nunca tinha cometido um ato infracional anteriormente, relata que se envolveu em um roubo de celular por influência de amigos. “Três colegas passaram de carro em minha casa e me chamaram para passear, sendo que pararam em um local e disseram que iriam roubar aparelho celular. Eu disse que não iria participar do ato e decidi ficar dentro do carro, mas quando eles foram pegos pela polícia informaram que eu tinha participado do roubo e a polícia foi em minha casa, me agrediu, pediu o produto do roubo e ameaçou me espancar se não entregasse algo para eles. De tanto apanhar com chutes, socos e tapas acabei pegando qualquer celular em casa e dei para eles dizendo que era produto roubado, só que o celular era de minha mãe. Estou muito arrependido por ter dado esse desgosto à minha mãe, mas com fé em Deus quando sair daqui não irei me envolver mais com amizades que só me prejudicaram”, conta arrependido.
A diretora da USIP, Aidil dos Santos Vaz, destacou a importância da assistência da Defensoria Pública na Unidade. “Avalio a presença da Defensoria de uma forma muito positiva, sendo nossa maior parceira no Estado com a compreensão que tem na garantia dos direitos e isso ajuda muito não só os adolescentes como também a gente que está na linha de frente na execução da medida. Contamos muito com a Defensoria”, pontuou.
Ainda, segundo Aidil, com a Defensoria Pública os adolescentes passam a refletir os erros e terem consciência do que fizeram para não cometer de novo. “Mesmo com as dificuldades que temos, conseguimos desenvolver diversas atividades como aulas de artes, música, futebol, atendimentos técnicos, grupos com adolescentes com temas que possam ajudá-los, fazendo da melhor forma possível. Além disso, a presença dos defensores públicos melhora o comportamento dos meninos e eles passam a acreditar e ter esperança, uma vez que só temos uma advogada na unidade que não consegue suprir a demanda e a Defensoria esclarece muito para os adolescentes, que passam a ter uma compreensão do processo, consciência e reflexão para não retornarem à unidade”, enfatizou.
Para o diretor operacional da Fundação Renascer, Carlos Viana, a Defensoria Pública está sempre provocando as outras instâncias para evitar superlotação. “Se não fosse a Defensoria nosso trabalho seria muito pior por causa da situação de superlotação, pois temos vários adolescentes com prazos expirados e a Defensoria está sempre provocando todas as instâncias para resolver a situação. Com o mutirão, percebemos que a partir da ação da Defensoria há uma resolutividade em algumas questões referentes, inclusive, à própria gestão. A Defensoria é o nosso maior apoiador no trabalho e desenvolvimento das atividades porque se você tem uma unidade superlotada dificulta acontecimento de várias atividades e com o apoio da Defensoria evita que as unidades estejam o tempo todo em condições de difícil atuação, por isso, é muito importante a participação da instituição”, destacou.
A unidade conta hoje com 86 adolescentes, embora tenha capacidade para apenas 45, sendo que maior número tem idade entre 15 e 18 anos. “Há meninos de 12 e 13 anos, mas maioria é de 15 a 18 anos”, afirmou Viana.
No total, foram analisados pelos defensores públicos 31 processos, sendo que em seis deles há advogado constituído e os demais são assistidos pela Defensoria Pública.